Brew #17
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“O que você está fazendo para combater o aquecimento global? Comprou uma ecobag para reduzir o uso de sacolas de mercado? Anda com sua garrafinha de água para reduzir o consumo de embalagens? Trocou o carro com a gasolina por um elétrico?
Falando sério: só essa boa vontade não tem sentido. Mais ainda, essa boa vontade chega a ser danosa.
Por qual motivo? Porque, ao pensar que está fazendo algo para combater o aquecimento global, você deixa de realizar as ações mais ousadas que são realmente necessárias”.
É com essa lapada que O Capital no Antropoceno, de Kohei Saito, começa. E talvez estejamos precisando de mais tapas na cara para acordar e enfrentar a realidade de que alteramos a existência do planeta para um ponto que não tem mais volta.
Os impactos da atividade econômica humana no planeta são tão grandes que os cientistas têm afirmado que a Terra entrou em uma nova era do ponto de vista geológico: o Antropoceno. ODS, ESG, nada disso enfrenta o problema em sua raiz. Tal qual nossa ecobag, Kaito afirma que essas práticas mascaram a manutenção do produtivismo capitalista sob uma aparência de responsabilidade ambiental. Ele alerta que sem uma mudança estrutural, essas estratégias apenas prolongam a lógica do crescimento destrutivo.
E se o problema é a obsessão pelo crescimento ilimitado do capitalismo, Saito propõe o Comunismo de Decrescimento como resposta. Um modelo econômico pós-capitalista que busca a redução consciente da produção e do consumo, priorizando a redistribuição de recursos e a preservação ambiental.
Esse livro traz muitas questões importantes, mas queria chamar atenção para um trecho logo no primeiro capítulo, onde ele afirma que “para escolher um futuro melhor, cada cidadão deve se levantar, falar e agir como parte interessada”. Isso me fez refletir bastante sobre qual o papel do design nesse contexto (spoiler: sou uma fudida designer).
Historicamente, o design tem reforçado práticas de consumo excessivo, criando desejos e demandas que alimentam o ciclo produtivista. Muitas vezes a superficialidade de soluções "sustentáveis", que servem apenas para manter a roda do capitalismo verde girando, são problemas de design. Digo isso no sentido de terem um design intencionalmente feito para ludibriar e capitalizar em cima da pauta ecológica. E digo no sentido também de terem um designer por trás disso.
Foi nesse turbilhão de reflexões sobre consumo e responsabilidade que me deparei com outra obra essencial para entender o papel do design nessa crise: Design, Ecology, Politics: Towards the Ecocene, de Joanna Boehnert. Se Saito desmonta o mito do crescimento infinito, Boehnert nos faz encarar como o design é peça-chave nesse quebra-cabeça. E é aqui que a conversa sobre design e sustentabilidade começa a ficar realmente interessante.
“O design desempenha uma função social e política que nem sempre é reconhecida dentro da própria indústria do design. Embora existam movimentos importantes na área buscando uma prática mais socialmente responsável, esses esforços são prejudicados pela forma como as relações de poder são reproduzidas pelo design e pela falta de análise dessas dinâmicas.
O design é uma prática que atua na mediação das relações sociais. Normalmente, ele reflete os valores e prioridades daqueles que determinam quais problemas de design devem ser abordados. Os interesses de grupos poderosos se manifestam no design.
- Joanna Boehnert
E se o design parasse de criar para vender e começasse a projetar para regenerar?
Boehnert fala de como a indústria do design opera dentro da lógica do capitalismo, priorizando o lucro e o crescimento do mercado – aliás, growth é a palavra do momento, né? – se sobrepondo às necessidades sociais e ecológicas. Mais do que isso, ela afirma que o design funciona através da violência simbólica, normalizando padrões de consumo insustentáveis, reforçando ideologias dominantes, ocultando impactos ambientais e silenciando a diversidade de narrativas.
Segundo Boehnert, muitas análises ambientais concentram-se na crítica ao consumo ao invés de questionar a produção. E é nesse ponto que reside a importância do design, porque se o design é essencial para a criação de modos de vida ecologicamente prejudiciais – desde a obsolência programada até o uso da psicologia para forçar pessoas a comprarem coisas que não precisam -, o design também é essencial para a produção de modos de vida ecológicos.
Se o design se propõe a resolver problemas, o design da nossa própria economia política é o principal problema de design.
A chave para enfrentar esse problema está em desafiar a ideia de que a natureza é um recurso para a exploração humana. E é daí que Boehnert desenvolve o conceito da ecoliteracia — ou seja, compreensão profunda dos princípios ecológicos — para integrar questões ambientais, sociais e políticas em suas práticas. Ou seja, não se trata apenas de transmissão de informação, mas um aprendizado ambiental que estimule o desenvolvimento de capacidade crítica e também de novas formas de ação.
Eu não pretendo me alongar aqui na definição da ecoliteracia, mas passa por idealizar um novo paradigma de ensino que nos permitam superar a ideologias dominantes e criar soluções que restauram ecossistemas, respeitam limites ecológicos e promovem justiça social. Exemplos disso incluem projetos de economia circular, produção local e iniciativas que priorizam comunidades vulneráveis.
O resultado é criar as bases da politização do processo de design e caminhar num movimento rumo ao Ecoceno.
O Ecoceno é um conceito que surge nessa obra, mas que é desenvolvido posteriormente por outros pesquisadores. Trata-se de uma nova era que substitui o Antropoceno. Esse conceito surge como uma crítica à lógica produtivista do capitalismo e busca promover relações regenerativas entre sociedade e meio ambiente, baseando-se em princípios de ecoliteracia e práticas de design que respeitem os limites planetários. Boehnert afirma: "O surgimento de um potencial futuro Ecoceno depende da disposição e da capacidade da humanidade de se organizar, em harmonia com o contexto ecológico, para níveis mais elevados de complexidade com respeito ao nosso contexto ecológico e uns aos outros" (p. 185)
Enquanto o Antropoceno enfatiza o impacto negativo da atividade humana sobre o planeta, o Ecoceno traz uma perspectiva de transformação e regeneração:
"O Ecoceno inquieta o horizonte de maneira que somos obrigados a abraçar o fim do capitalismo enquanto rejeitamos o fim do mundo, o que também significa a construção de futuros pós-capitalistas que sejam de fato sustentáveis e respeitosos aos limites da Terra. É o lembrete de que não basta acabar com o capitalismo, mas que precisamos fazer isso enquanto ainda há tempo. E ainda há tempo."
- Sabrina Fernandes em Ecocene Blog.
O caminho para o Ecoceno no design passa por abandonar a ilusão de neutralidade e abraçar sua responsabilidade política. Designers precisam assumir o papel de protagonistas na criação de sistemas mais justos e sustentáveis.
A crítica de Saito ao produtivismo capitalista e a proposta de Boehnert de um design ecoliterado e regenerativo apontam para caminhos viáveis e necessários. Mais do que minimizar impactos, o design precisa se reinventar como ferramenta de transformação social e ecológica.
Talvez o maior desafio do design seja parar de criar para vender mais e começar a projetar para viver melhor. E se, em vez de projetar para o mercado, começássemos a projetar para o planeta?
☕Recentemente o Bob’s resolveu surfar no colapso climático para vender milkshake. A marca lançou no último mês a campanha “Refrescamento Global” para anunciar seus milkshakes. O propósito seria de “ajudar o público a dar uma esfriadinha nas tensões do cotidiano e uma aliviada no estresse causado pelo calorão”. Enquanto cidades derretem sob recordes de temperatura e eventos climáticos extremos se tornam rotina, o aquecimento global vira uma piada de marketing. [Link da campanha]
☕Se você quer um jeito direto de tirar o greenwashing do design e colocar responsabilidade ecológica de verdade nos seus projetos, a Domestika tem um curso que pode ajudar: “Introdução ao design gráfico sustentável”, da Núria Vila Punzano. Não é publi (mas se a domestika quiser, tamo aí). [link do curso]
Pensei: e se esse livro incrível tivesse uma capa em português? Pois bem, fiz. Resolvi recriar a capa de Design, Ecology, Politics para uma versão nacional, e o desafio foi traduzir visualmente a conexão entre design e ecologia.
As possibilidades eram muitas, mas escolhi trazer uma referência direta ao design impresso - essas marcações de registro que aparecem nos arquivos de pré-impressão. No meio disso, uma planta emergindo de uma rachadura, simbolizando um novo mundo em construção. Como se o Ecoceno estivesse nascendo ali, na própria materialidade do design.
O processo foi todo feito no Photoshop, e finalizei a edição no CapCut. Ah, e se quiser usar esse mockup, ele está disponível no Notion da Brew.
Recentemente compartilhei essa informação nas minhas notas aqui no Substack e resolvi trazer pra cá. Testem e diga o que acharam nos comentários 👀
☕ "Essa é a melhor foto que já tirei, e o cliente não quis usar. Por favor, aproveitem, porque, do contrário, ela nunca veria a luz do dia." Foi assim que um post viralizou aqui no Substack, e não consegui parar de pensar em quantas imagens, textos e ideias incríveis seguem escondidas por aí, simplesmente porque nunca foram compartilhadas. Então fica o lembrete: compartilhe, compartilhe tudo!


☕ Ellard DeVane é um artista visual autodidata e multidisciplinar, conhecido por sua inovadora técnica de “arte do corte”. Ele cria hipnotizantes animações em stop-motion ao fatiar esculturas de argila, revelando padrões e rostos intricados quadro a quadro, resultando em uma narrativa visual fascinante. [@ellard_devane no Instagram]
☕ Já pensou em começar um hobby novo esse ano? Ultimamente, estou totalmente obcecada por vídeos de cerâmica fria. Parece ser uma daquelas atividades que são ao mesmo tempo terapêuticas e (relativamente) fáceis de fazer. Se bateu a curiosidade, esse vídeo explica melhor a técnica:
☕Janeiro teve uns bons 45 dias, e agora fevereiro já tô arrancando meus cabelos. Meu 2025 veio no modo turbo. Se você também tá nessa, fica o lembrete reconfortante que já circula pelas ruas do Rio:
Muito bom! Gostei muito de aprender sobre essa nova visão. Sou formada em desenho industrial, que é essencialmente para projetar coisas grandes e não tive aula de projetar para a desmontagem por exemplo. Muito se fala em reduzir plástico hoje em dia, como medida paleativa, quando deveríamos repensar toda a cadeia, pensar em sistemas circulares…. Pensar de uma forma totalmente nova, sem adaptações e puxadinhos, porque isso, definitivamente, não está dando certo.
Assim como o design, o setor publicitário em geral precisa dessa mudança de pensamento. Eu abracei essa ideia (e desespero) e tô tentando inspirar as pessoas a criarem com propósito. Esse ano decidi que um dos meus principais "clientes" será a Natureza. Tem horas que a desesperança bate, mas tô tentando lutar até onde o apocalipse deixar. 🥲 Obrigada por esta edição. 💛 Se quiser dar uma olhada no meu projeto, dá uma lida na minha Newsletter Criativistas.